quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Submarino - Thomas Vinterberg

BERLIM: Lars Von Trier ficou com a fama, mas o primeiro diretor a filmar segundo as regras naturalísticas do Dogma 95 foi Thomas Vinterberg, co-criador do movimento. Infelizmente, seus filmes posteriores não mantiveram o alto nível de “Festa de Família”, sua estreia em 1998. Até este “Submarino”, que foi recebido por parte da crítica como uma volta à forma.

O drama sombrio, baseado num romance aclamado de Jonas T. Bengtsson, filmado em 16 milímetros e com uma coloração azulada de fundo do mar, acompanha dois irmãos que sucumbiram à dissolução familiar e ao ambiente de miséria em que foram criados.

O filme começa com o choro de um bebê, assistido por duas crianças, enquanto a mãe procura uma garrafa de vermute. O trauma da morte do irmão menor, logo no início, marca a trajetória dos protagonistas (De novo, após Anticristo a morte da crianca volta a assombrar o cinema dinamarques e seus monges do Dogma.). Negligenciados por uma mãe alcoólatra e abusiva, tornam-se adultos problemáticos, com poucas chances de redenção. E é apropriadamente a morte da mãe que acaba por reuni-los após 20 anos de separação.

O mais velho, Nick, é agora um alcoólatra amargurado, violento, lacônico, de temperamento difícil, todo coberto de tatuagens e recém-libertado da prisão, que vive num abrigo e se relaciona com uma sem-teto que perdeu a guarda dos filhos. Os primeiros 45 minutos de projeção são dedicados a ele.

Mas logo conhecemos o mais novo, um jovem drogado de olhar vazio como um zumbi, que aparentemente nem sequer tem um nome. Ele é sempre referido como “o irmão de Nick” ou “o pai de Martin”. Tornou-se um pai solteiro após um acidente de carro, três anos atrás, matar sua esposa, e agora precisa equilibrar o vício com a responsabilidade de cuidar de uma criança pequena.

O roteiro é inteligente em materializar pontes visuais entre as histórias paralelas e ao aliviar ocasionalmente o tom miserável, que poderia se tornar sufocante, com intersecções cômicas – mesmo que tragicômicas.

Outro detalhe significativo é que a passagem entre a vida desgraçada de um irmão para a outra não é sincronizada. Os segmentos não se interligam cronologicamente. A opção estrutural é mais um modo de reforçar a falta de conexões entre os dois em suas vidas adultas. Cada qual tem seu inferno particular para arder durante o resto de sua existência.

Apenas por um breve momento o filme consegue aproximá-los, numa cena significativa, que enseja a possibilidade de futuro melhor para o pequeno Martin. Vinterberg quis, ao fim de todo o sofrimento, mostrar que existe esperança.

Em entrevista no Festival de Berlim, o cineasta admite que é seu filme mais "escandinavo" - talvez por isso, Submarino tenha recebido o prêmio principal da Academia Escandinava de Cinema. "Existem elementos, se é que se pode dizer, de Shakespeare em Festa de Família. O rei morto, rei está nu, a família dividida de Rei Lear, a indagação existencial de Hamlet. Tudo isso é verdade, mesmo que pareça muito pretensioso, mas sou filho de um intelectual e ele me criou na admiração dos clássicos. Bengstsson e Submarino são mais embasados na realidade da Dinamarca, da Escandinávia. Uma história de queda e redenção, de ascese, como aquelas que (Carl Theodor) Dreyer gostava de contar."

Ele reconhece que Submarino deve muito aos atores e não poupa elogios a Jakob Cedergren e Peter Plaugborg. "Eles foram fundo na investigação de personagens que são difíceis. A ideia aqui é ir fundo na vulnerabilidade e no sofrimento. É como se fosse necessário perder a cascas para renascer."

O diretor reflete agora sobre o que parece óbvio. "O Dogma morreu, é página virada, mas para nós todos foi muito importante. Surgimos como um grupo, uma geração cheia de ideias, querendo marcar o cinema. Se tentássemos fazê-lo individualmente, talvez não tivéssemos conseguido. Cada um seguiu seu caminho, está tendo de assumir seus limites. Mas ainda nos relacionamos. Lars, Suzanne Bier, eu. O problema é a novíssima geração do cinema dinamarquês, os órfãos do Dogma. Acho que eles enfrentam a pior crise da história do cinema no país."













domingo, 7 de novembro de 2010

Relacionamentos

Sempre acho que namoro, casamento, romance, tem começo, meio e fim.
Como tudo na vida. Detesto quando escuto aquela conversa:
- Ah,terminei o namoro...
- Nossa, estavam juntos há tanto tempo.....
- Cinco anos...que pena...acabou....
- é...não deu certo...
Claro que deu! Deu certo durante cinco anos, só que acabou.
E o bom da vida, é que você pode ter vários amores.
Não acredito em pessoas que se complementam. Acredito em pessoas
que se somam.
Às vezes voce não consegue nem dar cem por cento de você para você
mesmo, como cobrar cem por cento do outro?
E não temos essa coisa completa.
Às vezes ela é fiel, mas é devagar na cama.
Às vezes ele é carinhoso, mas não é fiel.
Às vezes ele é atencioso, mas não é trabalhador.
Às vezes ela é muito bonita, mas não é sensível.
Tudo junto, não vamos encontrar.
Perceba qual o aspecto mais importante para voce e invista nele.
Pele é um bicho traiçoeiro.
Quando você tem pele com alguém, pode ser o "papai & mamãe" mais
básico que é uma delícia.
E as vezes você tem aquele sexo acrobata, mas que não te impressiona...
Acho que o beijo é importante...e se o beijo bate...se joga...se não
bate...mais um Martini, por favor...e vá dar uma volta.
Se ele ou ela não te quer mais, não force a barra.
O outro tem o direito de não te querer.
Não brigue, não ligue, não dê pití.
Se a pessoa tá com dúvidas, problema dela, cabe a você esperar... ou não.
Existe gente que precisa da ausência para querer a presença.
O ser humano não é absoluto. Ele titubeia, tem dúvidas e medos, mas
se a pessoa REALMENTE gostar, ela volta.
Nada de drama.
Que graça tem alguém do seu lado sob pressão?
O legal é alguém que está com você, só por você. E vice versa.
Não fique com alguém por pena. Ou por medo da solidão.
Nascemos sós. Morremos sós. Nosso pensamento é nosso, não é compartilhado.
E quando você acorda, a primeira impressão é sempre sua, seu olhar, seu pensamento.
Tem gente que pula de um romance para o outro.
Que medo é este de se ver só, na sua própria companhia?
Gostar dói.
Muitas vezes voce vai sentir raiva, ciúmes, ódio, frustração...
Faz parte. Você convive com outro ser, um outro mundo, um outro universo.
E nem sempre as coisas são como você gostaria que fosse...
A pior coisa é gente que tem medo de se envolver.
Se alguém vier com este papo, corra, afinal você não é terapeuta.
Se não quer se envolver, namore uma planta. É mais previsível.
Na vida e no amor, não temos garantias.
Nem toda pessoa que te convida para sair é para casar.
Nem todo beijo é para romancear.
E nem todo sexo bom é para descartar... Ou se apaixonar... Ou se
culpar...
Enfim...quem disse que ser adulto é fácil ?

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Dinheiro & Felicidade

Receita para ser feliz mesmo com pouco dinheiro
Estudo de universidades americanas diz que o bem-estar depende de como gastamos o que temos e dá oito dicas para o consumidor


Se você não está feliz com seu dinheiro, provavelmente é porque não sabe gastá-lo. A provocativa afirmação é tema de um recente estudo realizado pelas Universidades de Harvard, Virginia e British Columbia, nos Estados Unidos, que procurou traçar as ligações entre consumo e felicidade. Segundo a pesquisa, o conceito de bem-estar não está relacionado com o tamanho de nossa riqueza, mas sim com a forma como gastamos o que temos. “O dinheiro nos deixa alegres quando pensamos nele, mas nem tanto quando o usamos. E isso não deveria acontecer”, afirma a professora de psicologia Elizabeth Dunn, da British Columbia, responsável pelo trabalho. A compra imediata impulsiva de bens e serviços é apontada pela pesquisadora como uma das principais causas da insatisfação dos consumidores atuais. “Muitas pessoas esquecem ou não sabem que planejar, antecipar e desejar são fatores essenciais para a felicidade”, explica. Analisando o comportamento de compradores de várias partes do mundo, a psicóloga americana e sua equipe listaram oito dicas que podem ajudar você a ser mais feliz com seu dinheiro.


1 - Comprar experiências e não coisas
O instrutor de artes marciais Alexei Caio, 35 anos, não tem tevê de plasma, computador de última geração nem móveis sofisticados. Mesmo assim, se considera uma pessoa plenamente feliz. “Prefiro gastar meu dinheiro em viagens do que com bens materiais”, declara. Todos os anos, Caio embarca em aventuras pela América Latina, fazendo caminhadas e conhecendo novos lugares. “Experiências proporcionam prazer em dobro, pois nos fazem felizes enquanto vivemos e, depois, quando recordamos”, diz a professora Elizabeth Dunn, da British Columbia. Investir em cursos, viagens, jantares e programas de lazer são boas maneiras de encontrar a satisfação pessoal. Além disso, experiências, mais do que coisas, podem ser divididas com outras pessoas, uma fonte comprovada de felicidade.

2 - Gastar com os outros e não apenas com você
Tudo o que fazemos para estreitar nossas relações pessoais aumenta a felicidade. E isso inclui gastar dinheiro. Segundo o estudo, doar valores ou objetos ativa áreas do cérebro relacionadas à recompensa. Ou seja, comprar presentes para as pessoas que você ama, fazer caridade e ajudar familiares, se forem atos voluntários, aumentam o bem-estar.

3 - Investir em pequenos prazeres
Se você tem dinheiro para gastar, é melhor comprar vários pequenos prazeres do que torrar tudo numa única aquisição. De acordo com a pesquisa, quando adquirimos algo de grande valor, temos uma satisfação momentânea, que diminui com o tempo. Compras menores, porém mais frequentes, garantem bem-estar constante. A professora Mariane D’Ávila, 45 anos, aprendeu essa lição. “Já cheguei a comprar 12 pares de sapatos de uma vez. Dizia: ‘Não gasto nunca, então posso fazer extravagâncias’”, conta. Hoje Mariane trocou os impulsos consumistas por sessões de massagem semanais. “Descobri que a felicidade está muito mais relacionada à minha qualidade de vida do que às peças caras no meu armário”, diz.

4 - Comprar sem pensar em trocar
Como foi comprovado no estudo, a possibilidade de troca induz ao gasto por impulso, um dos principais motivos de insatisfação. “Quando não precisamos nos comprometer com uma aquisição, perdemos o interesse por ela. Aí, o outro vestido que deixamos na loja parece mais bonito do que o que trouxemos para casa”, exemplifica a pesquisadora Elizabeth.

5 - Pagar agora e usar depois
O princípio é o oposto da política praticada pelas companhias de cartão de crédito, que estimulam os consumidores a comprarem agora e pagarem depois. Segundo os pesquisadores, é mais feliz quem consegue fugir dos parcelamentos e honra as compras à vista. “Essa dica vale para uma economia em recessão como a dos Estados Unidos, mas não para o Brasil”, afirma Fábio Mariano Borges, professor de pós-graduação em ciências do consumo da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). “Aqui a explosão do consumo da classe C se deve em grande parte à oferta de crédito, ou seja, ao parcelamento”, diz. O conselho de Borges para quem precisa financiar é colocar os gastos na ponta do lápis: “Não comprometa mais do que 20% de sua renda com o financiamento.”

6 - Planejar também o pós-compra
Segundo o estudo, a felicidade está nos detalhes. Por isso, precisamos considerar todos os aspectos de uma nova aquisição antes de confirmá-la. Expectativas muito altas em relação ao produto, por exemplo, podem levar à decepção. “Quando imaginamos como iremos incluir uma nova compra em nossa rotina, temos mais chances de tirarmos satisfação dela”, diz Elizabeth. Portanto, antes de pagar por um novo bem, temos que considerar quando vamos utilizá-lo e como.

7 - Não procurar apenas a melhor oferta
A pesquisa também sugere que, em muitos casos, economizar não significa garantia de felicidade. “Ao comparar só o preço, podemos descartar produtos que nos fariam felizes somente porque existem opções mais baratas”, afirma a pesquisadora Elizabeth. Segundo ela, é necessário considerar o preço sim, mas sem deixar de lado outras características, como durabilidade, praticidade e, claro, qualidade.

8 - Ouvir a opinião dos outros
Comprar algo apenas porque outras pessoas têm é um dos caminhos mais curtos para a infelicidade. No entanto, ouvir a opinião dos outros pode ajudar, e muito, na escolha daquilo que nos trará prazer. “Um observador atento é capaz de dizer que prato do restaurante nos fará mais felizes, apenas por identificar nossas reações ao ler o cardápio”, exemplifica a professora Elizabeth, da British Columbia. O professor Borges, da ESPM, concorda. Para ele, a internet facilita a vida do consumidor, pois disponibiliza críticas de outros compradores sobre qualquer tipo de bem ou serviço. “Consultar o julgamento alheio já é uma prática comum do cliente, porém, com o acesso cada vez maior à tecnologia, essa segunda opinião se torna mais procurada e legitimada”, diz.

Síndrome de Burn Out

Perfeccionismo é fator de risco para esta doença insidiosa, que ataca a motivação de gente que rala, sem distinção de cargos hierárquicos.
O "burn out", termo que em inglês designa a combustão completa, está incluído no rol dos transtornos mentais relacionados ao trabalho. Foi a terceira maior causa de afastamento de profissionais em 2009, segundo dados da Previdência Social.
A síndrome é bem mais que "mero" estado de estresse, não pode ser confundida.
Esse transtorno psíquico mescla esgotamento e desilusão. Pode ser desencadeado por uma exposição contínua a situações estressantes no trabalho, explica a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente no Brasil da Isma (International Stress Management Association), entidade que pesquisa o "burn out".
"A doença é gerada pela percepção de que o esforço colocado no trabalho é superior à recompensa. A pessoa se sente injustiçada e vai se alienando, apresentando sintomas como depressão, fobias e dores musculares."
É a doença dos idealistas, diz Marilda Lipp, do Centro Psicológico de Controle do Stress e professora de psicologia da PUC-Campinas.
"O 'burn out' é um desalento profundo, ataca pessoas dedicadas demais ao trabalho, que descobrem que nada daquilo pelo que se dedicaram valeu a pena."
O estresse, compara Lipp, tem um componente biológico forte, ligado a situações em que o corpo tem de responder ao perigo. Já o "burn out" é um estado emocional em que a pessoa não sente mais vontade de produzir.
"Tem a ver com o valor depositado no trabalho", diz Lipp. "Quem apresenta exaustão emocional, não se envolve mais com o que faz e reduz as ambições pode estar sofrendo do transtorno."
O diagnóstico não é fácil: a apatia gerada pelo "burn out" pode sugerir depressão ou síndrome do pânico.
Médicos, professores e policiais são grupos de risco, diz Duílio de Camargo, psiquiatra do trabalho ligado ao Hospital das Clínicas.



DESMAIOS
O professor Cláudio Rodrigues, 43, entrou em combustão total por duas vezes. Começou como um estresse, que foi se acumulando ao longo de dez anos.
Ele lecionava 13 horas por dia numa escola da zona sul de São Paulo. E se frustrava com salas lotadas e alunos desinteressados, conta.
"Via um aluno meu entregando pizza junto com alguém que nunca tinha estudado. Eu me sentia impotente como professor". Deprimido, se manteve afastado das salas por dois anos. Em 2004, depois de receber acompanhamento psiquiátrico e tomar medicação, voltou. Em maio deste ano, recaiu.
"Nada tinha mudado na escola, estrutura péssima. Eu me sentia responsável por estar levando todos os alunos a um caminho sem futuro."
No meio de uma aula, o professor começou a suar e sentir o corpo ficar mole. Saiu e desmaiou na escada. Na semana seguinte, enquanto caminhava para o trabalho, desmaiou de novo. Está afastado desde então.
"Sinto uma insatisfação por ver que o meu trabalho não vale a pena", desabafa.
A vigia Lucimeire Stanco, 34, também passou um tempo licenciada por causa de "burn out". Em 2006, ela fazia a ronda noturna em um colégio da zona leste. Passava a noite só e por duas vezes teve que se esconder quando tentaram invadir o lugar.
"Sentia desânimo porque não me tiravam daquela situação. Me sentia rejeitada, vítima." Ela se tratou e se readaptou. Hoje, só trabalha de dia, e acompanhada de outros vigias.
Casos como esses são tratados com psicoterapia e antidepressivos mas, segundo Marilda Lipp, a medicação só combate os sintomas.
"A pessoa precisa reavaliar o papel do trabalho em sua vida, aprender a dizer não quando não tem condições de executar algo e reconhecer o próprio valor, mesmo que outros não o façam."


FACA NA GARGANTA
"Eu era infeliz e não sabia", afirma a empresária Amália Sina, 45. Hoje ela é a dona do negócio, mas há quatro anos, era a vice-presidente, na América Latina, de uma multinacional e responsável pelas atividades da empresa em 22 países.
"Dava aquela impressão de que o mundo girava em torno do trabalho, sempre com a faca na garganta", diz.
Para a empresária, o apoio que teve da família e a prática de exercícios a ajudaram a suportar as pressões. Até ela deixar a função executiva.
A empresária adotou a estratégia correta para prevenir um "burn out", segundo o psiquiatra Duílio de Camargo. "A pessoa chega a esse estado sem saber o que tem. Se não tiver acolhimento da família, o desconforto aumenta."
Na visão de Eugenio Mussak, fisiologista e professor de gestão de pessoas, as providências para prevenir essa patologia do trabalho devem partir tanto do sujeito quanto da empresa.
Segundo Mussak, todo mundo que trabalha bastante deve se permitir algumas atividades diárias cuja única finalidade seja o prazer, para compensar o clima estressante. E se o ambiente de trabalho puder criar um "estado de férias", melhor ainda.
"Chefes compreensivos, que valorizam o esforço e respeitam os limites de seus subordinados criam um ambiente menos favorável ao "burn out'", diz o professor.
Ele continua: "É preciso respeitar o limite entre o que é profissional e o que é pessoal, e a empresa deve estimular o trabalhador a respeitar esses limites também."

São Paulo - O apóstolo que deturpou o cristianismo


O mundo cristão não seria o mesmo sem a mensagem que São Paulo transmitiu ao Império Romano. Para conquistar fiéis, ele fez concessões que desagradaram aos discípulos de Jesus – e ainda despertam acirradas discussões entre pensadores e religiosos.

Estamos no ano 34 da era cristã. Passaram-se poucos anos desde a crucificação de Jesus. Sua mensagem espalhou-se rapidamente por toda a Palestina e seus discípulos eram implacavelmente perseguidos, principalmente pelos judeus. Os seguidores de Jesus são acusados de heresia e traição à Lei de Moisés. Em Jerusalém, um jovem judeu chamado Saulo faz verdadeiras atrocidades com os cristãos.

Nos tempos de estudante, Paulo presenciou uma situação que estaria na origem de sua “cristofobia”. Um dos alunos mais brilhantes era um jovem chamado Estêvão, um nazareno – nome dado aos que seguiam os ensinamentos de Cristo. Em uma discussão, Estêvão foi fiel a sua fé e declarou que Jesus era o messias: tal afirmação provocou a ira dos colegas, inclusive de Paulo. Pela blasfêmia, Estêvão foi levado diante do Sinédrio e condenado à morte por apedrejamento. Conforme o costume da época, as pessoas que iam apedrejar o condenado deveriam tirar suas próprias vestes e colocá-las aos pés de uma testemunha. No martírio de Estevão, a testemunha era Paulo. A partir desse episódio, Paulo, que já era um intransigente defensor da lei e dos costumes judaicos, viu nos seguidores de Cristo uma ameaça real à sua própria religião. Foi então que passou a cultivar um ódio crescente pelos nazarenos e tornou-se um implacável perseguidor dos membros dessa seita.

Depois de muito aterrorizar os cristãos de Jerusalém, decidiu agir na Síria. Foi quando aconteceu sua conversão no caminho de Damasco. Informado de que, a cada dia, cresce a comunidade cristã em Damasco, na Síria, pede e obtém do Sinédrio, o Supremo Tribunal da comunidade judaica de Jerusalém, cartas de recomendação aos rabinos daquela cidade, autorizando-os a caçar os hereges cristãos. Persegue-os furiosamente, invade suas casas e os manda para prisão. Acompanhado de alguns homens, percorre a cavalo os cerca de 200 quilômetros até Damasco. Depois de sete dias de viagem, sob um sol escaldante, consegue finalmente avistar as muralhas da cidade.

Mas, de repente, uma forte luz vinda do céu incide sobre ele e assusta seu cavalo, que o joga no chão. Naquele instante, o jovem judeu ouve uma voz que diz: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”

Paulo, então sob a condição e proteção de cidadão tornou-se um apóstolo do cristianismo no Império Romano, visitando várias cidades. Entrando inclusive em atrito com Pedro e Lucas. O termo apóstolo, no sentido de evangelizador, é freqüentemente usado para se referir a São Paulo. Não há evidências históricas, entretanto, de que ele tenha conhecido Jesus Cristo.

O historiador André Chevitarese, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), especialista em cristianismo e judaísmo antigos, concorda: “O cristianismo, tal como existe hoje, deve muito a Paulo. Se não fosse o apóstolo, ele provavelmente não teria passado de mais uma seita judaica”. Isso não quer dizer que o trabalho dos 12 apóstolos tenha sido irrelevante, mas eles pregaram numa região, a Palestina, que viria a ser devastada pelos romanos entre os anos 66 e 70. “Sem dúvida, Paulo foi o apóstolo que teve maior repercussão com o passar dos séculos”

A influência de Paulo é indiscutível. Mas, para uma corrente de historiadores e teólogos, ele deturpou os ensinamentos de Jesus Cristo – a ponto de a mensagem cristã que sobreviveu ao longo dos séculos ter origem não em Cristo, mas em Paulo. Esses pensadores julgam ser mais correto dizer que o que existe hoje é um “paulinismo”, não um cristianismo. “As cartas de São Paulo são uma fraude nos ensinamentos de Cristo. São comentários pessoais à parte da experiência pessoal de Cristo”, afirmou o líder pacifista indiano Mahatma Ghandi, em 1928. Opinião semelhante tem o prêmio Nobel da Paz de 1952, o alemão Albert Schweitzer, que declarou: “Paulo nos mostra com que completa indiferença a vida terrena de Jesus foi tomada”.

As principais críticas da corrente antipaulina concentram-se em pontos polêmicos das cartas do apóstolo. Nelas, entre outras coisas, Paulo defende a obediência dos cristãos ao opressivo Império Romano, bem como o pagamento de impostos, faz apologia da escravidão, legitima a submissão feminina e esboça uma doutrina da salvação distinta daquela que, segundo teólogos antipaulinos, teria sido defendida por Jesus. “A mentira que foi Paulo tem durado tanto tempo à base da violência. Sua conversão foi uma farsa”, afirma Fernando Travi, fundador e líder da Igreja Essênia Brasileira. Os essênios eram uma das correntes do judaísmo há 2 mil anos, convertidos na primeira hora ao cristianismo. “Ele criou uma religião híbrida. A prova disso é o mundo que nos cerca. Um mundo cheio de guerra, de sofrimentos e de desespero.”

A descoberta, no século passado, de escrituras datadas dos primeiros anos do cristianismo, como os Manuscritos do Mar Morto, o Evangelho dos 12 Santos (ou da Vida Perfeita) e o Evangelho Essênio da Paz, indica que boa parte do conteúdo das cartas de Paulo está em oposição aos ensinamentos de Jesus (leia quadro na pág. 64). “Existem sérios indícios de que, como num plano de sabotagem, Paulo divulgou uma doutrina falsificada em nome do messias”, diz ele. Opinião parecida tem o pastor batista americano Edgar Jones, autor do livro Paulo: O Estranho. “Jesus de Nazaré deve ser cuidadosamente diferenciado do Jesus de Paulo. Gerações e séculos passaram até que a corrente paulina com seu forte apelo em favor do Império Romano ganhasse ascendência sobre a corrente apostólica”, diz o teólogo.

O fato é que, até o século 4, o cristianismo dividia-se em duas correntes distintas, uma liderada pelos discípulos de Paulo e outra pelos seguidores dos apóstolos de Cristo. Quando o cristianismo tornou-se a religião oficial do Império Romano, a corrente paulina saiu-se vitoriosa. “As idéias de Paulo, afáveis aos dominadores, foram definitivamente incorporadas à doutrina cristã”, diz Fernando.

Para os críticos de Paulo, um exemplo dessa “afabilidade” está presente na Epístola aos Romanos. “Cada um se submeta às autoridades constituídas, pois não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram estabelecidas por Deus. Aquele que se revolta contra a autoridade opõe-se à ordem estabelecida por Deus”, escreve Paulo. E continua: “É também por isso que pagais impostos, pois os que governam são servidores de Deus”. “Essa passagem revela que ele estava a serviço das autoridades romanas. Jesus, por sua vez, se insurgia contra as leis de Estado”, afirma Fernando. Para os defensores de Paulo, esse texto foi tirado de seu contexto e tornou-se, ao longo dos séculos, uma teoria metafísica do Estado. “O texto só tinha valor para quem vivia em Roma, onde qualquer movimento de desobediência seria esmagado”, diz o teólogo Pedro Vasconcellos.

Outro ponto controverso das epístolas paulinas refere-se à defesa que seu autor faz da escravidão. Na Epístola aos Efésios, Paulo é taxativo: “Servos, odedecei, com temor e tremor, em simplicidade de coração, a vossos senhores nesta vida, como a Cristo”. Para os antipaulinos, o apoio dado pelo apóstolo à escravidão tem sido usado pela Igreja ao longo dos séculos para legitimar situações espúrias de dominação e diverge radicalmente da palavra de Cristo, que pregava um mundo livre de opressões.

O apóstolo dos pagãos também é bombardeado por suas posições a respeito das mulheres. Na carta endereçada à comunidade cristã de Colosso, ele escreve: “Quanto às mulheres, que elas tenham roupas decentes, se enfeitem com pudor e modéstia. (...) Durante a instrução, a mulher conserve o silêncio, com toda submissão. Não permito que a mulher ensine, ou domine o homem”. Suas palavras atraem até hoje a ira das feministas, que o acusam de misoginia.

Outro petardo disparado pelos críticos diz respeito à doutrina da salvação defendida por Paulo. “Paulo diz que os pecados são perdoados se a pessoa acreditar que Jesus morreu na cruz por ela. É a doutrina da salvação em que o herói derrama seu sangue e todos são perdoados por causa dele. Enquanto isso, Jesus diz: ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’. Para Jesus, a salvação será dada àqueles que seguirem seus ensinamentos”, afirma Fernando Travi.

Conservador ou radical, fiel ou não a Jesus Cristo, São Paulo foi, sem dúvida, um dos poucos evangelizadores – se não o único – a fazer o cristianismo passar da cultura semita à greco-romana, possibilitando que ela se tornasse uma religião mundial.
trechos retirados da revista Superinteressante