sexta-feira, 12 de maio de 2017

hornonios da felicidade

Os hormônios da felicidade: como desencadear efeitos da endorfina, oxitocina, dopamina e serotonina
Ao longo dos séculos, artistas e pensadores se dedicaram a definir e representar a felicidade. Nas últimas décadas, porém, grupos menos românticos se juntaram a essa difícil tarefa: endocrinologistas e neurocientistas.
O objetivo é estudar a felicidade como um processo biológico para encontrar o que desencadeia esse sentimento sob o ponto de vista físico.
Ou seja, eles não se importam se as pessoas são mais felizes por amor ou dinheiro, mas o que acontece no corpo quando a alegria efetivamente dispara, e como "forçar" esse sentimento.
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Neste sentido, há quatro substâncias químicas naturais em nossos corpos geralmente definidas como o "quarteto da felicidade": endorfina, serotonina, dopamina e oxitocina.
A pesquisadora Loretta Breuning, autora do livro Habits of a happy brain ("Hábitos de um cérebro feliz", em tradução livre), explica que "quando o seu cérebro emite uma dessas químicas, você se sente bem".
"Seria bom que surgissem o tempo todo, mas não funcionam assim", diz a professora da Universidade Estadual da Califórnia (EUA).
"Cada substância da felicidade tem um trabalho especial para fazer e se apaga assim que o trabalho é feito."
Conheça a seguir maneiras simples para ativar essas quatro substâncias químicas da felicidade, sem drogas ou substâncias nocivas.

1. Endorfinas
As endorfinas são consideradas a morfina do corpo, uma espécie de analgésico natural.
Descoberta há 40 anos, as endorfinas são uma "breve euforia que mascara a dor física", classifica Breuning.
Comer alimentos picantes é uma das maneiras de liberar enddorfina
Por isso, comer alimentos picantes é uma das maneiras de liberar esses opiáceos naturais, o que induz uma sensação de felicidade. Mas essa não é a única maneira de obter uma "injeção" de endorfina.
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De acordo com estudo publicado no ano passado por pesquisadores da Universidade de Oxford (Inglaterra), assistir a filmes tristes também eleva os níveis da substância.
"Aqueles que tiveram maior resposta emocional também registraram maior aumento na resistência a dores e sentimento de unidade em grupo", disse à BBC Robin Dunbar, professor de Psicologia Evolutiva e autor do estudo.
Dançar, cantar e trabalhar em equipe também são atividades que melhoram, por meio de um aumento nas endorfinas, a união social e tolerância à dor, afirma Dunbar.

2. Serotonina
Como a serotonina flui quando você se sente importante, o sentimento de solidão e até mesmo a depressão são respostas químicas à sua ausência.
"Nas últimas quatro décadas, a questão de como manipular o sistema serotoninérgico com drogas tem sido uma importante área de pesquisa em biologia psiquiátrica e esses estudos têm levado a avanços no tratamento da depressão", escreveu em 2007 Simon Young, editor-chefe na revista Psiquiatria e Neurociência.
Dez anos mais tarde, a depressão se situa como a principal causa principal de invalidez em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Trata-se de transtorno mental que afeta mais de 300 milhões de pessoas.
A estratégia mais simples para elevar o nível de serotonina é recordar momentos felizes, diz Alex Korb, neurocientista do site Psicologia Hoje.
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Um sintoma da depressão é esquecer situações felizes. Por isso, acrescenta Korb, olhar fotos antigas ou conversar com um amigo pode ajudar a refrescar a memória.
O neurocientista descreve três outras maneiras: tomar sol, receber massagens e praticar exercícios aeróbicos, como corrida e ciclismo.

3. Dopamina
A dopamina é costuma ser descrita como responsável por sentimentos como amor e luxúria, mas também já foi tachada de ser viciante. Daí sua descrição como "mediadora do prazer".
"Baixos níveis de dopamina fazem que pessoas e outros animais sejam menos propensos a trabalhar para um propósito", afirmou John Salamone, professor de Psicologia na Universidade de Connecticut (EUA), em estudo sobre efeitos da dopamina no cérebro publicado em 2012 na revista Neuron.
Por isso, acrescentou o pesquisador, a dopamina "tem mais a ver com motivação e relação custo-benefício do que com o próprio prazer."
O certo é que essa substância química é acionada quando se dá o primeiro passo rumo a um objetivo e também quando a meta é cumprida.
Além disso, pode ser gerada por um fato da vida cotidiana (por exemplo, encontrar uma vaga livre para estacionar o carro) ou algo mais excepcional (como receber uma promoção no trabalho).
A melhor maneira de elevar a dopamina, portanto, é definir metas de curto prazo ou dividir objetivos de longo prazo em metas mais rápidas. E celebrar quando atingi-las.

4. Oxitocina
Por ser relacionada com o desenvolvimento de comportamentos e vícios maternos, a oxitocina é muitas vezes apelidada de "hormônio dos vínculos emocionais" e "hormônio do abraço".
Segundo estudo publicado em 2011 pelo ginecologista e obstetra indiano Navneet Magon, "a ligação social é essencial para a sobrevivência da espécie (humanos e alguns animais), uma vez que favorece a reprodução, proteção contra predadores e mudanças ambientais, além de promover o desenvolvimento do cérebro."
"A exclusão do grupo produz transtornos físicos e mentais no indivíduo, e, eventualmente, leva à morte", acrescenta.
Por isso, o obstetra considera que a oxitocina tem uma "posição de liderança" nesse "quarteto da felicidade": "É um composto cerebral importante na construção da confiança, que é necessária para desenvolver relacionamentos emocionais."
Abraçar é uma forma simples de se conseguir um aumento da oxitocina. Dar ou receber um presente é um outro exemplo.
Breuning, da Universidade da Califórnia, também aconselha construir relações de confiança, dando "pequenos passos" e "negociando expectativas" para que ambas as partes possam concretizar o vínculo emocional.

sábado, 11 de março de 2017

Os Irmaos Karamazov

  1. "O vazio é o espaço da liberdade, a ausência de certezas. Mas é isso o que tememos: o não ter certezas. Por isso trocamos o voo por gaiolas. As gaiolas são o lugar onde onde as certezas moram." Os Irmãos Karamazov, Dostoiévski.

Escrever II

  1. As 22 dicas de ouro para escritores profissionais de Stephen King (pessoalmente eu assino embaixo!) do livro “On Writing“
  2. 1. Pare de assistir à televisão. Ao in...vés, leia tanto quanto puder
    Se você for um escritor iniciante, sua televisão deve ser uma das primeiras coisas a serem eliminadas. É “venenosa à criatividade”, diz Stephen. Os escritores precisam olhar para dentro de si mesmos e direcionar a atenção à vida da imaginação.
    E para tanto devem ler o máximo possível. King leva consigo um livro a todo lugar que vai e lê até mesmo durante as refeições. “Se você quiser ser um escritor, deve fazer duas coisas acima de todas: ler muito e escrever muito”. Leia muito e trabalhe constantemente para refinar e redefinir seu trabalho enquanto lê.
  3. 2. Prepare-se para mais falhas e críticas do que pode lidar
    King compara escrever ficção a travessar o Atlântico em uma banheira, pois em ambos “há inúmeras oportunidades para duvidar de si mesmo”. Não apenas vai duvidar de si mesmo como também haverá outros duvidando de você. “Se você escrever (ou pintar, dançar, esculpir ou cantar, acredito) alguém irá tentar te fazer se sentir mal por isso”, King escreve.
    Constantemente você tem que continuar escrevendo mesmo quando não está com vontade de fazê-lo. “Parar um trabalho apenas porque é difícil, seja emocionalmente ou por bloqueio de criatividade, é uma má ideia”, ele escreve. E quando falhar King sugere que continue otimista. “Otimismo é uma resposta perfeitamente adequada à falha”.
  4. 3. Não perca seu tempo tentando agradar as pessoas
    De acordo com King, a grosseria deve ser a menor de suas preocupações. “Se você pretende escrever da forma mais verdadeira possível, seus dias como membro da sociedade bem-educada estão com os dias contados”. King costumava se envergonhar do que escrevia, especialmente após receber cartas que o acusavam de ser preconceituoso, homofóbico, sanguinário e até mesmo psicopata.
    Por volta de seus 40 anos, percebeu que todo bom escritor já fora acusado de não possuir talento algum. King resolveu esse dilema definitivamente. Ele escreve: “Se você não aprova o que escrevo, posso apenas dar de ombros. É só o que tenho”. Como não poderá agradar a todos os leitores o tempo todo King aconselha que pare de se importar.
  5. 4. Escreva principalmente para você mesmo
    Você deve escrever porque isso traz felicidade e satisfação. “Eu escrevo pelo puro prazer do ato, e se você puder escrever por prazer, você pode escrever para sempre”.
    O escritor Kurt Vonnegut fornece um insight parecido: “Encontre um assunto com o qual se importa e que sinta que outros também vão se importar. Será este genuíno cuidado – não seu jogo de palavras – o mais sedutor e cativante elemento em sua escrita”.
  6. 5. Enfrente o que for mais difícil escrever
    “As coisas mais importantes são as mais difíceis de dizer”, King escreve. “São aquilo de que você sente vergonha porque palavras degradam seus sentimentos”. A maioria das grandes obras são precedidas de horas de reflexão. Segundo King “A escrita é o pensamento aprimorado”.
    Ao abordar assuntos difíceis certifique-se de ir a fundo. King diz “Estórias são objetos encontrados, como fósseis no solo… Estórias são relíquias, partes de um desconhecido mundo pré-existente”. Escritores deveriam ser como arqueologistas que escavam por tanta história quanto podem encontrar.
  7. 6. Ao escrever desconecte-se do mundo exterior
    A escrita deve ser uma atividade completamente íntima. Coloque sua mesa no canto de uma sala e elimine toda possibilidade de distração, desde telefones até janelas abertas. Stephen aconselha: “Escreva com a porta fechada; reescreva com a porta aberta”. Você deve manter total privacidade entre você e seu trabalho. O primeiro rascunho é “completamente cru, o tipo de coisa que me sinto livre para fazer com a porta fechada – é a história nua, vestida apenas de meias e roupas íntimas”.
  8. 7. Não seja pretensioso
    “Uma das coisas realmente ruins que você pode fazer ao seu trabalho é rebuscar o vocabulário, à procura de palavras longas por estar ligeiramente envergonhado de usar as curtas”, diz o autor que compara este erro ao de vestir um animal de estimação em trajes de gala – ambos o animal e o dono estarão constrangidos pelo excesso. Um icônico empresário, David Ogilvy, escreve em um memorando para seus funcionários: “Nunca use expressões como reconceptualizar, desmassificação, atitudinalidade, criticalidade. Estes são símbolos de um idiota pretensioso”. Além disso, não use símbolos a menos que seja necessário. “Simbolismo existe para adornar e enriquecer, não para criar um senso artificial de profundidade”, escreve King.
  9. 9. Não exagere na preocupação com a gramática
    De acordo com King escrever é principalmente sobre sedução, não precisão. “A linguagem não deve sempre usar gravata e sapatos finos. A ficção não se trata de exatidão gramatical, mas sim de fazer com que o leitor esteja receptível e confortável à estória para que então você possa contá-la”. Você deve concentrar-se em fazer o leitor se esquecer de que está de fato lendo uma estória.
  10. 10. Domine a arte da descrição
    “A descrição começa na imaginação do escritor, mas deve acabar na mente do leitor” escreve King. A parte importante não escrever o suficiente, mas também limitar o quanto você escreve. Visualize a experiência que quer que o leitor tenha e então transcreva o que vê em sua mente para palavras. Você precisa descrever de uma forma que vá trazer ao leitor uma sensação de reconhecimento” ele diz.
    A chave para uma boa descrição é a clareza, tanto em observação quanto em escrita. Utilize imagens claras e vocabulário simples para evitar que o leitor se sinta exaurido. “Em muitos casos quando o leitor abandona alguma estória porque está chata, tal sensação se dá porque o autor se inflou com seus poderes de descrição e perdeu de vista suas verdadeiras prioridades, que seria manter o andamento da estória”.
  11. 11. Não dê informação de contexto demais
    “O que você precisa lembrar é que existe uma diferença entre falar sobre o que você sabe e usar isso para enriquecer história”, escreve King. “Isso é bom. Aquilo, não”. Inclua apenas detalhes que levem a história para frente e que motivem o público a continuar lendo.
    Se for utilizar de alguma pesquisa, tome cuidado para não ofuscar a história. Pesquisas devem ficar “ao máximo no pano de fundo e no contexto”, diz King. Você pode estar intrigado com o que está aprendendo, mas seus leitores vão se importar mais com os personagens e suas histórias.
  12. 12. Conte histórias sobre o que as pessoas realmente fazem
    “Uma escrita ruim é muito mais que péssima sintaxe ou má observação; uma escrita ruim geralmente surge de uma forte recusa de contar histórias sobre o que as pessoas realmente fazem — encarar o fato, digamos, de que assassinos às vezes, ajudam senhoras idosas a atravessar a rua”, escreve King. As pessoas em suas histórias são aquilo com o que os leitores mais se importam, então, certifique-se de que você tenha conhecimento de todas as dimensões que seus personagens podem ter.
  13. 13. Corra riscos; não fique só naquilo que é seguro
    Primeira e mais importante dica, pare de usar a voz passiva. É o maior indicador de medo. “Eu estou convencido de que o medo é o maior responsável por uma escrita ruim”, diz King. Escritores devem endireitar os ombros, levantar a cabeça e deixar a escrita comandar.
    “Experimente tudo o que quiser, não importa o quão entediante ou chocante isso possa ser. Se funcionar, ótimo. Se não, esqueça”, afirma King.
  14. 14. Perceba que você não precisa de drogas para ser um bom escritor
    “A ideia de que o esforço criativo e de que as substâncias que alteram a mente estão ligados é um grande mito pop-intelectual do nosso tempo,” diz King. Aos seus olhos, os escritores que abusam de substâncias são apenas viciados. “Qualquer discurso de que drogas e álcool são necessários para encontrar uma maior sensibilidade é só besteira”.
  15. 15. Não tente roubar a voz de alguém
    Como King diz “Você não pode ver um livro como um míssil a ser lançado”. Quando você copia o estilo de outro autor por qualquer razão além de prática, você produz nada além de “pobres imitações”. Isso acontece porque não se pode recriar a forma como experimenta uma verdade, especialmente com uma olhada rápida a vocabulário e trama.
  16. 16. Entenda que a escrita é uma forma de telepatia
    “Todas as artes dependem de algum grau de telepatia, mas eu acredito que escrever é sua pura essência”, conta King. Um importante elemento da escrita é a transferência. Seu trabalho não são as palavras na página, mas sim a transferência de ideias da sua cabeça para a cabeça dos leitores.
    “As palavras são só o meio pelo qual a transferência acontece”, afirma King. Em seu conselho sobre escrita, Vonnegut também recomenda que os escritores “usem o tempo de um total estranho de uma forma que ele ou ela não se sinta perdendo tempo nenhum”.
  17. 17. Leve sua escrita a sério
    “Você pode abordar o ato de escrever com nervosismo, excitação, esperança ou desespero”, diz King. “Faça isso de qualquer forma, menos sem seriedade”. Se não quer levar sua escrita a sério, ele sugere que você feche seu livro e faça outra coisa.
    Como diz a escritora Susan Sotang, “a história deve atingir um nervo — em mim. Meu coração tem que acelerar quando eu ouvir a primeira linha na minha cabeça. Eu tenho que tremer diante do risco”.
  18. 18. Escreva todo dia
    “Uma vez que eu começo a trabalhar em um projeto, eu não paro e não diminuo o ritmo, a menos que eu precise”, diz King. “Se eu não escrevo todo dia, os personagens começam a fugir da minha mente… Eu começo a me perder o enredo e o ritmo.”
    Se você falha em escrever de forma consistente, a animação com a ideia começa a desaparecer. Quando o trabalho começa a parecer com uma obrigação “é o beijo da morte”— King descreve. Seu melhor conselho é que trabalhe com “uma palavra por vez”.
  19. 19. Termine seu primeiro rascunho em três meses
    King gosta de escrever 10 páginas por dia. No período de três meses, isso soma cerca de 180.000 palavras. “O primeiro rascunho de um livro — mesmo o de um longo — não deve levar mais que três meses, o tempo de uma estação”, ele diz. Se você precisa gastar muito tempo em seu trabalho, King acredita que a história começa a tomar um ar estranho.
  20. 20. Quando terminar de escrever, afaste-se por um tempo
    King aconselha seis semanas de “recuperação” depois que você terminar de escrever, assim, você pode clarear sua mente para amarrar as pontas soltas do enredo ou melhorar o desenvolvimento de personagens. Ele pontua que a percepção inicial de um escritor sobre um personagem pode ser tão errada quanto à de um leitor.
    King compara o processo de escrita e revisão com a natureza. “Quando você escreve um livro, você passa dia após dia detectando e identificando as árvores”, ele escreve. “Quando você acaba, você tem que voltar atrás e olhar a floresta”. Ao encontrar os erros, ele diz que “você está proibido de se sentir deprimido por causa deles ou de se condenar. Erros acontecem com os melhores de nós”.
  21. 21. Tenha coragem de fazer cortes
    Ao revisar, autores geralmente têm dificuldade de descartar palavras que passaram muito tempo escrevendo. Mas, como King aconselha, “Desapegue, desapegue, mesmo que parta seu egocêntrico pobre coração escritor, desapegue”.
    Embora revisão seja uma das partes mais difíceis de escrever, você precisa deixar de fora todas as partes chatas para que a história possa fluir. Em seu conselho sobre escrita, Vonnegut diz que “se uma sentença, não importa quão excelente, não esclarece seu assunto de alguma forma útil e nova, jogue fora”.
  22. 22. Seja saudável e viva uma boa vida
    É importante ter um forte equilíbrio em sua vida para que a escrita não consuma tudo. Nos 11 mandamentos do pintor e escritor, Henry Miller, ele aconselha: “Mantenha-se humano! Veja pessoas, vá a lugares, beba se quiser.”

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Escrever

Schoppenhauer é um niilista brilhante. Foi fortemente influenciado pelo budismo e sua visão de que a vida é sofrimento, sofrimento e ainda sofrimento. O pensamento oriental o marcou tanto que ele deu a seu poodle o nome de Atma – alma, em sânscrito. Sua frase clássica é uma que diz: “A pior coisa que pode acontecer a alguém é nascer”.
Fora filosofar, Schoppenhauer foi, também, cultor do estilo. Escreveu um livro chamado A Arte de Escrever, lançado no Brasil pela LPM. Selecionei alguns tópicos. Qualquer pessoas que escreva – ainda que apenas emails – ganha lendo.
1) Usar muitas palavras para comunicar poucos pensamentos é o sinal incondundível da mediocridade. O homem inteligente resume, ao contrário, muitos pensamentos em poucas palavras.
2) Um bom cozinheiro pode dar gosto até a uma sola de sapato. Da mesma forma, um bom escritor pode tornar interessante o assunto mais árido.
3) Existem três classes de autores. Primeiro, aqueles que escrevem sem pensar. Escrevem a partir da memória, de reminiscências, ou diretamente a partir de livros alheios. Essa classe é a mais numerosa. Em segundo lugar, há os que pensam para escrever. Eles pensam justamente para escrever. São numerosos. Em terceiro lugar, há os que pensaram antes de se pôr a escrever. Escrevem exatamente porque pensaram. Estes são raros.
4) Não há nenhum erro maior do que imaginar que a última palavra usada é a melhor, que algo escrito mais recentemente constitui um aprimoramento do que foi escrito antes, que toda mudança é um progresso.
5) Não há nada mais fácil do que escrever de maneira que ninguém entenda. Em compensação, nada é tão difícil quanto expressar pensamentos significativos de modo que todos os compreendam.
6) Palavras ordinárias podem ser usadas para dizer coisas extraordinárias.
7) A mente trivial é reconhecida pelo seu estilo afetado.
8) Como alguém que de tanto cavalgar desaprende de andar, alguns eruditos de tanto ler livros se tornam burros.

sábado, 3 de dezembro de 2016

O ser humano é mau ?

O ser humano é mau?
por Victor Lisboa
Uma pacífica gerente de lanchonete. Um pacato estudante universitário. Um inofensivo cidadão americano. Todos sem precedentes de violência. Normais, comuns, iguais a nós. Todos capazes de torturar, matar e estuprar.
Saberemos de suas histórias em breve, ao tentarmos responder a seguinte pergunta:
O ser humano é mau?
Antes, porém, precisamos voltar à 1970 e contar a curiosa historia da Dra. Jane Goodall. Antropóloga e etologista especializada em primatas, ela amava um de nossos parentes mais próximos, o chimpanzé. Passou anos estudando uma turma deles em seu ambiente natural, numa reserva na Tanzânia.

1. Os angélicos chipanzés da senhora Jane Goodall
A Dra. Goodall admirava o comportamento benevolente dos chipanzés. Como são nossos parentes próximos, por pertencerem à família dos hominoidea, Dra. Goodall via neles a prova de que éramos, no fundo, seres bondosos e gentis.
Em 1971, a pesquisadora publicou o livro. Nele, defendia que os chimpanzés eram a prova de que nós, seres humanos, vivíamos antigamente em paz e harmonia, conectados com a natureza, e de que a guerra não era algo natural, mas uma detestável invenção do homem “racional”.
Trata-se de uma tese similar a do bom selvagem de Rousseau, segundo a qual o ser humano era originalmente bom, mas foi corrompido pela civilização e pela noção de propriedade. Algo muito diferente  da opinião de Hobbes, de que o homem era naturalmente propenso ao mal e que a civilização serviria para conter seus instintos “criminosos” (o curioso é que, na vida pessoal, Hobbes era muito mais decente e honesto do que Rousseau).
Três anos após a publicação do livro, houve uma reviravolta que chocou a Dra. Goodall. A população do grupo de chimpanzés que pesquisava aumentou com o nascimento de novos filhotes. Com isso, tornou-se mais difícil conseguir comida para todos. Ela começou a notar uma sutil mudança no comportamento deles.
Pareciam mais hostis, inquietos.
Em certo momento e sem razão aparente, o grupo de chipanzés dividiu-se em duas tribos. A maior permaneceu no antigo território, enquanto a menor se embrenhou na floresta. De início, a relação entre ambas as tribos era pacífica. Cada um no seu território, sem problemas. Mas em algumas semanas os membros do grupo maior, sem qualquer motivo, passaram a fazer incursões para atacar e matar os seus antigos amigos.
As investidas eram impiedosas e brutais. Os agressores cercavam os outros chimpanzés quando estavam mais indefesos e quebravam seus ossos, rasgavam sua carne com os dentes e, se não os matavam de imediato, deixavam-nos aleijados para morrerem vagarosamente. As principais vítimas eram outros machos. Só que, em um dos ataques, uma fêmea idosa foi trucidada.
No final, a tribo menor foi praticamente dizimada.
Dra. Goodall ficou horrorizada. Seus amados chimpanzés, nossos parentes próximos, mostraram-se brutais. Posteriormente, ficou comprovado que chimpanzés machos até mesmo costumam atacar filhotes separados das mães e praticar canibalismo com suas jovens vítimas.
A tese defendida no livro da Dra. Goddal mostrou-se totalmente furada.

2. A banalidade do mal e o Experimento de Milgram
A atitude dos amiguinhos da Dra. Goodall não teria surpreendido em nada outra mulher e escritora. Hannah Arendt, prisioneira de um campo de concentração na Segunda Guerra, tinha opinião contrária sobre a natureza humana. Judia, Hannah chegou a ofender seus amigos judeus ao propôr que a maldade típica dos nazistas não era privilégio dos alemães, até porque eles receberam apoio de membros da comunidade judaica.
Pior ainda, durante o julgamento de um criminosos nazista (Adolf Eichmann, ex-tenente da SS — a organização paramilitar do partido nazista) ela propôs que o réu não era um monstro, mas um ser humano comum, que praticara o que muitos seres humanos “normais” teriam feito se colocados nas mesmas circunstâncias.
Essa era a sua teoria: o mal não é algo extraordinário; o mal é algo comum, banal.
A banalidade do mal, segundo Hanna Arendt, está no fato de que a maldade não é praticada exclusivamente por loucos ou psicopatas, mas por pessoas normais que aceitam as premissas de seu Estado e que se conduzem de acordo com as convenções sociais por acreditarem que são adequadas e justas.
Pois um dia um pesquisador decidiu verificar cientificamente se Hannah Arendt tinha razão. Em 1961, o psicólogo americano Stanley Milgram fez um experimento patrocinado pela universidade de Yale. A pesquisa e seus resultados ficaram famosos no mundo todo como O Experimento Milgram (The Milgram Experiment).
Em resumo, Milgram publicou nos jornais um anúncio para voluntários participarem de um teste. Os voluntários eram instruídos a fazer perguntas para um outro suposto voluntário (na verdade, um ator) que estava em outra sala e com o qual se comunicavam por meio de um sistema de som.
Ao lado do voluntário estava um pesquisador. Diante do voluntário havia um aparelho cheio de botões. Era explicado a ele que o aparelho estava conectado a fios elétricos que, por sua vez, ficavam presos ao pulso do homem na sala ao lado.
O pesquisador apresentava ao voluntário um questionário e o instruía a fazer perguntas ao outro sujeito. Quando esse errasse uma resposta, o voluntário deveria lhe aplicar um choque. A intensidade do choque deveria aumentar 15 volts a cada resposta errada.
Do outro lado da sala, como já dito, não havia outro voluntário, mas um ator sem fio nenhum conectado a seu pulso. Ele deveria errar perguntas do questionário de propósito e, quando aplicado o falso choque, fingiria gemer de dor. A medida em que os supostos choques aumentassem, ele deveria gritar, simular um enfarto e, depois, permanecer em silêncio, como se algo muito ruim houvesse ocorrido.
O objetivo do experimento era saber até onde pessoas comuns, pacatos cidadãos americanos, seriam capazes de ir apenas porque estavam autorizados por um pesquisador de uma universidade.
Os resultados falam por si:
65% dos voluntários chegaram a aplicar choques de até 450 volts em suas vítimas. Alguns continuaram a aplicar choques mesmo quando a “vítima” já não respondia coisa alguma e presumivelmente estava morta ou havia desmaiado. Nenhum dos voluntários que se recusou a administrar os choques finais exigiu que o experimento em si mesmo tivesse um fim, e nenhum deles foi à sala ao lado para verificar o estado de saúde da vítima.

E antes que alguém insinue que a culpa é dos americanos, do sistema capitalista e da McDonalds, é bom esclarecer que, nos anos seguintes, a equipe de Milgram repetiu o experimento em vários outros países do mundo.
Em todos, o resultado sempre foi o mesmo.
Na conclusão de sua pesquisa, Stanley Milgram foi claro:
“Pessoas comuns, simplesmente fazendo seu trabalho e sem qualquer hostilidade particular, podem se tornar agentes de um terrível processo destrutivo.
Mais ainda, mesmo quando os efeitos destrutivos de seu trabalho se tornam patentemente claros, e lhes é pedido que prossigam agindo contra os padrões fundamentais da moralidade, relativamente poucas pessoas são capazes de resistir a autoridade.”

3. A verdadeira face dos falsos prisioneiros de Stanford
Embora o Experimento Milgram tenha por objetivo provar a incapacidade da maioria de resistir a ordens de uma autoridade, a pergunta que se faz é outra. Nós obedecemos a ordens injustas porque tememos a punição por nossa resistência ou obedecemos porque, no fundo, gostamos de fazer o mal?
No livro em que analisa o julgamento daquele criminoso nazista (Eichmenn em Jerusalém), Hannah Arendt demonstra que, na Alemanha da Segunda Guerra, os funcionários do Estado que se recusavam a matar e torturar outros seres humanos não recebiam nenhuma punição atroz, com exceção apenas dos momentos finais da guerra (disso falaremos adiante).
No máximo, eram colocados em funções subalternas, podendo ficar tranquilos com sua consciência de não estarem participando de uma atrocidade. Se continuaram, portanto, é porque não se importavam com as crueldades que praticavam, ou talvez as apreciassem.
Portanto, talvez a verdade seja o inverso, como Hobbes propôs: as pessoas comuns são gentis e bondosas apenas quando as regras sociais e do Estado exigem que se portem dessa maneira, pois temem ser punidas se revelarem sua verdadeira natureza. Por outro lado, essas mesmas pessoas “normais” seriam capazes de praticar crueldades quando as autoridades lhes permitissem ou ordenassem porque, no fundo, gostam do que fazem.
Talvez um dos experimentos mais assustadores tenha sido aquele que durou menos de uma semana e terminou muito antes do previsto, por ter despertado algo no coração de seus participantes que, possivelmente, seja melhor deixar adormecido.
Em 1971, durante seis dias, vinte e quatro estudantes da Universidade de Stanford foram selecionados pelo psicólogo Philip Zimbardo para assumirem aleatoriamente papéis de guardas e prisioneiros em uma prisão de mentira. Havia algumas regras a serem obedecidas, e os falsos guardas deveriam livremente adotar as medidas que considerassem adequadas para que os falsos prisioneiros se comportassem.
Tudo poderia ter sido um engraçado faz-de-conta, uma brincadeira inofensiva, pois havia apenas colegas, e sabiam que a prisão era uma grande farsa.
Porém, em poucos dias o Experimento de Stanford se revelou um espetáculo sinistro.
No primeiro dia, verificou-se que os participantes ajustaram-se a seus papéis para além das expectativas do pesquisador. Os guardas adotaram medidas autoritárias e chegaram a submeter alguns  prisioneiros à tortura psicológica e a diversas formas de humilhações.
Muitos dos prisioneiros submetiam-se aos abusos sem protestar.
Nos dias seguintes, os guardas decidiram que os prisioneiros deveriam abdicar de seus nomes e decorar seus números identificadores, para que percebessem não possuir personalidade ali dentro. Os guardas obrigaram os prisioneiros a repetir seus números identificadores e passaram a adotar punições físicas para os que erravam ou se recusavam a fazê-lo.
As condições sanitárias decaíram rapidamente, pois os guardas, exigindo que os prisioneiros defecassem e urinassem em baldes que colocaram em suas celas, deixavam de trocar os baldes no caso de desobediência. Outra punição criada foi tirar o colchão das celas dos prisioneiros que reclamavam, para que dormissem no chão.
A seguir, os guardas começaram a forçar os prisioneiros a ficarem nus, como método de humilhação e disciplina.
Um prisioneiro que se recusou a comer foi colocado em uma “solitária” inventada pelos próprios guardas, consistente em um armário escuro. Os guardas orientaram aos outros prisioneiros a ficarem esmurrando as portas do armário, e depois disseram-lhes que soltariam o rebelde se todos abdicassem de seus lençóis e dormissem direto no colchão — apenas um prisioneiro aceitou sacrificar seu bem-estar para livrar o companheiro da solitária.
Segundo os registros do experimento, vários guardas demonstraram evidentes sinais de sadismo e se portaram de forma desnecessariamente cruel.
Alguns deles reclamaram quando o experimento teve de ser abruptamente interrompido após o sexto dia. Outra surpresa para Philip Zimbardo e sua equipe foi a facilidade com que muitos prisioneiros assumiam uma postura submissiva, tolerando os abusos e até mesmo cooperando com os abusadores.
Embora as conclusões a respeito do experimento sejam objeto de debate até hoje, não precisamos nos limitar a testes feitos em situações controladas. Temos exemplos reais de que algo estranho ronda o coração humano.

4. Compliance e como um trote pode ser a desculpa que faltava
Compliance é um filme americano de produção independente que narra uma história real. Embora não tenha a intenção de estragar o filme para aqueles que desejam assisti-lo, basta dizer que seu roteiro relata como pessoas “normais”, pacatos funcionários de lanchonetes, são facilmente convencidos a praticar crueldades contra pessoas submetidas a seu poder.
Como disse, o filme se baseia em uma série de incidentes verídicos que ocorreram em 2004 nos Estados Unidos, todos resultantes de trotes criminosos realizados por David R. Stewart, um pai de família com cinco filhos.
Stewart, dotado de uma lábia fenomenal, ligava aleatoriamente para lanchonetes das franquias McDonalds e pedia para falar com o gerente. A seguir, convencia o gerente (muitas vezes, uma mulher) de que era agente da polícia local. Induzindo esse gerente a revelar o nome de uma de suas funcionárias mais jovens, logo a seguir informava que tal menina estava sendo investigada como suspeita de crimes como furto e tráfico.
Na sequência de seu trote, Stewart orientava o/a gerente a prender em um banheiro ou dispensa essa funcionária e explicava que, enquanto a polícia se dirigia para o local, os funcionários da lanchonete deveriam proceder a uma busca pessoal na menina, na procura de provas do seu crime. A busca era comandada por Stewart do outro lado do telefone, e ele orientava o gerente ou outros funcionários a despirem a vítima e, até mesmo, a procurarem por drogas em suas cavidades corporais.
Há pelo menos oito trotes registrados. Em muitos dos casos, a funcionária era uma menor de idade. Em quase todos os casos, os gerentes e/ou outros funcionários aproveitaram a situação para humilhar e até mesmo constranger sexualmente a vítima.
Pelo menos um desses trotes resultou na prática de um crime violento.
Para desmascarar o trote, bastava a qualquer dos envolvidos confirmar com a polícia local a veracidade das acusações. Exigia apenas o esforço de fazer-se uma ligação. Isso sem falar no próprio fato de a qualquer um era possível questionar a moralidade e legalidade das instruções de uma suposta autoridade.
Porém, todos pareciam estar desejosos demais de acreditarem numa situação que lhes permitiria expressar o que há de pior na sua natureza.

5. Os bonobos trepam como o Reich gosta…
Não é um quadro lisonjeiro sobre a natureza humana, esse que traçamos até agora. Mas talvez haja uma esperança.
Como vimos, lá no início do texto, os chimpanzés são um de nossos ancestrais mais próximos, da mesma família de primatas. Mas também existe um tipo de primata que, diferente de nossos outros parentes próximos, parece não ter propensão à violência. São os bonobos.
Se hoje em dia os chimpanzés (pan troglodytes) são reconhecidos como animais muito violentos, os bonobos (pan paniscus) ficaram famosos entre os cientistas por terem uma índole totalmente pacífica. Diversamente de seus primos, os bonobos nunca praticam ataques letais uns contra os outros, e são raríssimos os casos de agressão.
Naturalmente calmos, os bonobos são conhecidos entre os pesquisadores como os macacos hippies. Herbívoros, a organização de seu grupo é sempre matriarcal, enquanto os chimpanzés são patriarcais. Se um bonobo eventualmente tenta agredir uma fêmea, é repreendido por todo o grupo e passa um tempo “de castigo”.
Outra diferença em relação aos chipanzés é o tempo e a energia que os bonobos gastam em determinada atividade: o sexo.
Sem exagero, eles passam o dia inteiro transando. Bonobos despendem grande parte de seu tempo livre com sexo, em todo tipo de combinações de idade e de gênero entre os parceiros, sendo que práticas lésbicas são comuns entre as fêmeas.
Na verdade, os bonobos são os únicos primatas que, como os humanos, fazem sexo um de frente para o outro, podendo olhar-se diretamente nos olhos durante a cópula. E os pesquisadores constataram que os intercursos sexuais são não apenas uma fonte de prazer para os bonobos, mas também uma forma de fortalecer a coesão e a solidariedade entre os membros do grupo.
É, também, uma forma de conciliar conflitos entre membros do grupo.
Talvez seja apenas especulação, mas isso lembra muito a teoria da economia sexual e o conceito de potência orgástica criados por William Reich. Alemão meio amalucado, Reich considerava que a impossibilidade de o indivíduo realizar plenamente sua sexualidade, liberando completamente a tensão através do orgasmo, era a causa fundamental de todas as neuroses do ser humano.
Para Reich, as neuroses seriam consequência de todas as inibições crônicas que a civilização impôs à livre expressão da excitação sexual. Disso resultariam indivíduos que internalizam sua ansiedade e externalizam até mesmo fisicamente sua rigidez psicológica, pessoas propensas à violência e a diversas formas de sadismo cotidiano.
Segundo essa teoria, em neuróticos a busca pelo gozo seria substituída pela busca pelo poder, e tais indivíduos tenderiam a aceitar rotinas enfadonhas. Esses indivíduos seriam vitimados por fobias, compulsões, depressão e sentimento de solidão. Reprimidos, eles buscariam em alguma autoridade, religiosa ou política, a energia sexual que não encontram em si mesmas.
Para Reich, tudo isso começou a mudar, à medida em que desmantelamos muitas das crenças e sistemas de nossos antepassados. Estaríamos no limiar de uma revolução sexual cujos efeitos em nossa civilização ainda não foram completamente percebidos.
Seria um cisne negro, um evento cujas consequências ainda não somos capazes de compreender em sua integralidade, pois a transformação de nossos costumes ainda encontra forte resistência naquelas estruturas de poder que se alimentam de indivíduos neuróticos.

6. O chimpanzé e o bonobo que moram em nós
Somos chimpanzés naturalmente violentos ou bonobos pacíficos que ficaram malvados após milênios de restrição de sua energia sexual abundante?
Recentemente, cientistas descobriram que o ser humano está geneticamente tão próximo do bonobo como do chimpanzé. É como se fôssemos a encruzilhada genética de duas formas de viver, a agressiva e a pacífica.
Não podemos esquecer que, em todos os experimentos descritos acima, sempre houve indivíduos, ainda que uma minoria, que se recusaram a seguir o caminho mais fácil da obediência e da agressão autorizada. No experimento de Milgram, pelo menos um terço dos voluntários não prosseguiram aplicando choques.
Na falsa prisão de Standford, alguns prisioneiros sacrificaram seu bem-estar para beneficiar os companheiros, e o experimento foi interrompido porque uma das alunas que entrevistava os participantes protestou veementemente, sem apoio dos colegas. Na série de trotes criminosos contra funcionárias de lanchonetes, Thomas Simmers, um modesto subalterno, arriscou perder seu emprego e foi o único dos envolvidos que se recusou a obedecer as ordens do suposto policial.
Com sua recusa, o trote começou a ser desmascarado.
Hannah Arendt também narra, no livro em que trata da banalidade do mal, a história de dois irmãos camponeses que, convocados pelos nazistas a servir às tropas da SS no final da guerra, recusaram-se a assinar a convocação. Diferente do que ocorria antes, naquele momento de iminente derrota, a recusa era punida com sentença de morte, e os camponeses foram condenados.
No dia da execução dos dois irmãos, eles escreveram uma carta às suas famílias: “preferimos morrer do que carregar em nossas consciências coisas tão terríveis”.
Não devemos menosprezar nossa capacidade de resistir. Talvez o que mais dignifique a espécie humana seja a coragem de uma minoria que ousa dizer “não” às autoridades e também aos seus próprios instintos de chimpanzé, de poucos que não cedem à pressão da maioria e arriscam o próprio bem-estar para não causar sofrimento a outros.
Sob essa ótica, todo aquele corajoso o suficiente para se desviar do caminho dos “homens comuns” e criar uma rota alternativa é candidato a impor um fim à barbárie, quando ela ameaça prevalecer entre nós.

E então? O ser humano é mau?
Claro, a situação não é tão simples assim. Somos muito mais complexos do que a pergunta sugere. Porém, existe um interessante provérbio sobre dois lobos que reflete nossa natureza, e talvez seja conveniente trocar os personagens desse provérbio.
Cada um de nós tem um chimpanzé e um bonobo dentro de si. E todos os dias, com nossas ações e com os caminhos que decidimos tomar, escolhemos se alimentamos o chimpanzé ou o bonobo.
Podemos dar de comida sempre ao chimpanzé, e assim faremos parte de um círculo vicioso de violência e hostilidade, deixando o bonobo morrer a míngua. Ou podemos alimentar o bonobo, enfraquecendo o chimpanzé e ajudando a construir uma civilização em que o sentido de toda vida humana seja tornar a vida dos demais seres mais tolerável e menos sofrida aqui neste mundo.
Em que lado você prefere ficar? Costumo dizer que prefiro o lado do pão que tem a manteiga. Mas, nesse caso, diria que prefiro o lado em que o pessoal está transando sem parar.

Brasil 2016

Quando paro para pensar no que poderia ser feito, para vivermos melhor, não perco as esperanças, mas desanimo. Há um problema gravíssimo em todas as nossas inst...ituições, que não nasceu hoje, mas que tampouco parece estar por acabar: as pessoas são ensinadas a serem felizes sozinhas, a buscarem o sucesso exclusivamente individual. Não adianta uma professora falar sobre solidariedade, justiça e cidadania, se tudo isso não for uma prática dela e da própria escola. De alguma forma, as virtudes são ensinadas para incutir culpa, raramente para enaltecer um projeto de satisfação coletiva. Faculdades de todos os cursos fazem o mesmo. Depois, quando os alunos se formam, não adianta esperar que sejam cidadãos solidários, pois não é para isso que são preparados. Precisamos experimentar a ideia de justiça, de colaboração, de acolhimento, alteridade e empatia, como práticas mais valiosas do que as vantagens individuais. O que criticamos, geralmente é o que replicamos. Como professores, devemos levar para toda a comunidade a verdade de um projeto coletivo de viver bem. Diariamente, faz-se o oposto. Depois a sociedade vai reclamar do egoísmo. Em nosso pais, o que professores e outras lideranças têm transmitido como valores supremos? Poder de compra e de conquistas pessoais. Quando observamos isso, percebemos que não há "inversão de valores", porque com raríssimas exceções, as pessoas reproduzem o que lhe são ensinadas. Difícil mudar isso, mas, no nosso dia a dia, com micro revoluções, podemos fazer a nossa parte.
Rogerio Monteiro Barbosa

Car Wash Considerações

DE ALMA LAVADA
por Francisco Costa
Terminou agorinha mesmo um interessante debate, no Senado, sobre a Lei Anticorrupção e de Abuso de Autoridade.
Na mesa, o Juiz Federal Silvio Rocha; Gilmar Mendes, Ministro do STF e Presidente do TSE; Renan Calheiros, presidente do Senado; Roberto Requião, Senador, relator do PL sobre o assunto e o Juiz Federal Sérgio Fernando Moro, do Paraná.
Silvio Rocha, progressista, muito preocupado com o abuso de autoridade nos bairros pobres.
Se eu não conhecesse o histórico de Gilmar Mendes, a sua biografia e os seus feitos golpistas, diria que é de esquerda, tal as posições externadas, muito pelas diferenças que tem com Moro.
Renan Calheiros, embora conservador, corrupto e oportunista, nesta questão em pauta, tem posição progressista, até por advocacia própria.
Roberto Requião, sem comentários, um corajoso e independente Senador.
E Moro… Coitado.
Espertamente, pela ordem, Renan deu a palavra, primeiro, ao Silvio, depois ao Gilmar, que sentaram o cacete em Moro, vermelho como camarão na sauna.
Passada a palavra ao Führer de Curitiba, o sujeito não tinha o que dizer, com todo o seu arrazoado desmontado pelos dois que o antecederam.
Seguiu-se Requião, que sentou a porrada no autoritarismo, no abuso de autoridade, chegando a dizer que era fascismo.
Abriu-se para os debates, para as perguntas, e pensando que Moro iria passear, como faz em Curitiba, o primeiro que estava inscrito era o seu amigo pessoal Álvaro Dias, sem condições de defendê-lo, limitando-se a pedir mo adiamento da votação do PL.
Caiado tentou balbuciar qualquer coisa antipetista, mas só conseguiu também pedir o adiamento da votação do PL.
O momento alto ficou por conta de Lindbergh Farias, que cobrou, um a um, os abusos de autoridade cometidos contra Lula, com dados: circunstâncias, horários, depoimentos de juristas (citou até Rui Barbosa), despachos pesados de instâncias superiores contra Moro, em outros processos, inclusive de Gilmar, o chamando de irresponsável e dono da justiça, culminando com a afirmação “o senhor cita muito os Estados Unidos. O senhor consegue imaginar um juiz de primeira instância, lá do Texas (fez cara de pouco caso, sacaneando Curitiba, no sentido de poder político) gravando uma conversa telefônica entre Bill Clinton e Obama? O senhor gravou conversas da dona Marisa com os filhos, com a nora, conversas íntimas, de família, e jogou na mídia. Isto não é abuso de autoridade, covardia? O senhor gravou telefonemas entre advogados e clientes, o que é inadmissível em qualquer país do mundo. O Presidente Lula vive da sua imagem internacional, que o senhor conspurcou e não provou nada. Como compensar isso, como indenizar isso?”… Com Moro cabisbaixo, mais vermelho que a camisa do Internacional (houve um momento em que pensei que ele fosse chorar).
Para lacrar, Renan devolveu a palavra a Gilmar, que contou um encontro seu com um amigo, um dos maiores juristas do mundo, português, que se mostrou surpreendido com a legislação brasileira, que permite o vazamento de telefonemas grampeados e depoimentos que ocorrem em segredo de justiça, com Gilmar respondendo a ele: “a legislação não permite isso. Isso é coisa de um juiz brasileiro.”
Devolvida a palavra a Moro, mais constrangido que virgem na noite de núpcias, peladinha, ele alegou que “tudo isso é uma questão de interpretação da lei, não se pode punir um juiz por questão de interpretação da lei”.
Seguiu-se o Senador Humberto Costa: “se está escrito que a prisão preventiva é de dez dias, o juiz pode até transformar esses dez dias em horas, mas somando-se todas as horas o resultado será dez dias, não é uma questão de interpretação mas de cumprimento puro e simples. Se a lei diz que a condução coercitiva só pode se dar quando um intimado não comparece diante do juiz, sem um motivo relevante, é a mesma coisa, questão de cumprimento, não de interpretação. Isso é abuso de autoridade”, e Moro com carinha de fundo de bacia, mais vermelho que absorvente usado.
Terminado o debate, Moro ficou isolado, de pé, sem saber o que fazer, desnorteado, até que Requião coraçãozão foi até ele, apertou-lhe a mão e o levou para fora do recinto.
Em quase meio século de magistério nunca dei um esporro tão bonito num aluno safado.
Estou com a alma lavada.
Francisco Costa
Rio, 01/12/2016.