Estudo de economistas da FGV relaciona criminalidade à desestrutura familiar
ANTÔNIO GOISDA SUCURSAL DO RIO
Estudo dos economistas Gabriel Hartung e Samuel Pessoa, da Fundação Getúlio Vargas, conclui que fatores como maior proporção de filhos de mães adolescentes ou de famílias onde não há o pai ou a mãe presente aumentam a criminalidade -anteontem, o governador Sérgio Cabral Filho afirmou que a legalização do aborto ajudaria a reduzir a violência.
Hartung e Pessoa compararam estatísticas de criminalidade nos municípios paulistas de 1999 a 2001 com taxas de fecundidade verificadas em 1980.No estudo, eles afirmam que a literatura criminal já descobriu fortes evidências de que crianças nascidas de mães solteiras, criadas sem o pai ou nascidas de mães com baixa escolaridade têm mais probabilidade de se envolver em crimes.Hartung ressalva que o estudo não trata diretamente de aborto, tema do livro "Freakonomics", de Steven Levitt, que associa a redução de crimes em Nova York à legalização do aborto duas décadas antes.
Na pesquisa, porém, Hartung e Pessoa afirmam que "é possível fazer uma relação direta entre os resultados de Levitt e o nosso". "Relacionamos fração de filhos de mães adolescentes e filhos de famílias em que não há o pai ou mãe presente com a criminalidade 20 anos mais tarde. Não defino [toda] gravidez de mãe solteira ou de mãe adolescente como gravidez indesejada, mas afirmo que uma gravidez na adolescência ou de mãe solteira tem maior probabilidade de ser indesejada", disse Hartung à Folha.
Afirmação semelhante foi feita nesta semana pelo economista Marcelo Neri, também da FGV, ao divulgar um estudo. Ao falar da maior probabilidade dos jovens do sexo masculino de se envolverem em atos violentos, Neri diz que "no Brasil, a contrapartida feminina de jovens homens solteiros a atividades criminosas é a incidência da gravidez precoce".
O trabalho de Hartung e Pessoa foi criticado por demógrafos. Em resposta a ele, o pesquisador José Eustáquio Diniz Alves, do IBGE, escreveu um artigo em que diz que "os dados das pesquisas do IBGE não possibilitam estabelecer se a relação entre gravidez indesejada e violência é real ou espúria e qual o sentido de causalidade" entre essas variáveis.
"Dizer que a gravidez indesejada aumenta o crime, como afirmou Hartung, pode até ser pontualmente verdade, mas escamoteia as principais causas da violência e torna as mulheres sem marido e seus filhos os bodes expiatórios de um problema que é muito mais complexo. Pior ainda, dizer que o controle de natalidade é um instrumento fundamental para o combate à criminalidade no Brasil é receitar um remédio errado para um público alvo desfocado, além de ferir e agredir os princípios estabelecidos, nacionalmente e internacionalmente, dos direitos sexuais e reprodutivos", disse, no texto.